quinta-feira, 6 de março de 2008

CPMF pode deixar herança para bancos

A Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) foi extinta, mas deixou uma herança. Os bancos, responsáveis pela retenção do tributo, ainda podem precisar fazer desembolsos significativos por conta dela. O Conselho de Contribuintes, tribunal administrativo que julga as autuações da Receita Federal, começa a analisar alguns planejamentos ofertados pelas instituições para grandes empresas no intuito de driblar o recolhimento da contribuição.

Santander, Citibank e Itaú já tiveram seus casos julgados. Para os três bancos, o Conselho determinou o recolhimento da CPMF. No Estado de São Paulo, onde concentram-se as grandes instituições financeiras, as autuações fiscais de CPMF somam R$ 2,9 bilhões. Segundo a Delegacia Especial de Instituições Financeiras (Deinf) de São Paulo, R$ 1 bilhão desse total tem como alvo um planejamento utilizando uma Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários (DTVM) pertencente ao mesmo conglomerado financeiro. Outro R$ 1,6 bilhão envolve autuações que questionam casos de uso de câmaras de compensação ou outro sistema interno para transferência de valores, evitando assim a movimentação de recursos nas contas correntes dos clientes.


Nos casos do Santander e do Citibank, o planejamento usou a DTVM dos respectivos grupos. Chamado de "pagline plus", o planejamento do Santander envolvia a Santander Noroeste DTVM. A DTVM recebia os recursos do cliente do banco. Isso incluía cheques recebidos pelo cliente do banco. A DTVM tinha uma conta no banco Santander. Os recursos dos clientes mantidos na conta da DTVM eram usados para pagar os fornecedores do cliente. Dessa forma, evitava-se a movimentação dos recursos nas contas correntes dos clientes. O resultado permitia evitar a cobrança da CPMF no momento em que os valores eram usados para o pagamento dos fornecedores dos clientes. Isso era possível porque a legislação previa alíquota zero de CPMF para as operações das DTVMs. Portanto, os débitos na conta da Santander Noroeste DTVM junto ao banco não pagavam a contribuição.

A economia de 0,38% de CPMF valia a pena para empresas com grande movimentação de cheques ou pagamentos recebidos de seus clientes. A Petrobras foi uma das companhias mencionadas como usuárias do serviço no caso do Santander, cujo autuação atingiu R$ 290 milhões.

O planejamento oferecido aos clientes pelo Citibank era muito semelhante. No caso utilizou-se a Citibank DTVM como detentora da conta na qual aconteciam os débitos de recursos dos clientes.

Nos dois casos, a fiscalização da Receita alegou que a alíquota zero de CPMF se aplicava apenas a atividades próprias das distribuidoras de títulos expressamente listadas em uma portaria que definiu o alcance do benefício. E a atividade exercida pelas DTVMs no planejamento desenhado em conjunto com os bancos não era um deles. Esse foi um dos argumentos acatados pelo Conselho para manter a exigência da contribuição. Apesar de a CPMF ser devida pelos clientes dos bancos, a exigência da contribuição diretamente das instituições financeiras se justificou por serem elas as responsáveis pela retenção do tributo.

Outro caso analisado pelo Conselho é o do Itaú, em outro tipo de operação. O banco adquiriu participações societárias liquidadas com transferências de títulos públicos. A transferência de propriedade dos títulos, porém, foi feita por sistema interno do banco e os recursos não transitaram pelas contas correntes nem do Itaú e nem de quem vendeu as participações, salvando as transferências de valores da cobrança da CPMF. Na mesma fiscalização, o Itaú também foi autuado por ter realizado para seus clientes o pagamento de empréstimos, despesas e também aquisição de ativos com títulos públicos. Os clientes, na verdade, eram subsidiárias e coligadas do banco. Também neste caso, as transferências se deram por meio do sistema interno do Itaú, sem transitar pela conta corrente das empresas. A autuação contra o banco foi de R$ 92,4 milhões.


A fiscalização entendeu, porém, que tais operações foram contra a legislação da CPMF. Segundo a Receita, a lei determina que os tipos de liquidação realizados pelo Itaú deveriam necessariamente incluir uma movimentação financeira que pagaria a contribuição. O Conselho acatou o argumento.

Segundo o titular da Deinf, Marco Antonio Ruiz, a CPMF é o tributo que tem acumulado mais vitórias ao Fisco no conselho de contribuintes, mesmo com os bancos sendo defendidos por grandes escritórios e tributaristas que não têm se limitado à apresentação dos argumentos em papel e têm solicitado a argüição oral durante praticamente todos os julgamentos. Ruiz esclarece, porém, que os bancos têm recorrido à última instância do próprio conselho para reverter as primeiras decisões e podem levar o assunto ao Judiciário.

Fernando Zilveti, sócio do Zilveti e Sanden Advogados, diz que as decisões do Conselho estão sendo bem-fundamentadas, mas discorda das conclusões dos conselheiros. "No caso do uso da DTVM o Conselho desconsiderou operações que possuem inclusive substância econômica porque são próprias das instituições financeiras", argumenta.

O consultor Luís Rogério Farinelli, do Machado Associados, acredita que o conselho tem somente aplicado a legislação. "A tendência é que esses planejamentos sejam realmente derrubados porque no caso da CPMF a lei foi muito feliz ao fechar as brechas que poderiam ser usadas para evitar o seu pagamento."

Procurado, o escritório Mattos Filho, que representa o Santander no processo, não quis se pronunciar. O Citibank e o Itaú não comentaram o assunto. Procurada, a Petrobras não se manifestou.

Valor On Line

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