terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Conservadores por Obama

Conservadores por Obama
Por Melvyn Krauss
26/02/2008


John McCain, o provável candidato republicano para presidente, gosta de dizer que foi um "soldado de infantaria" na Revolução de Reagan. Também fui, trabalhando a partir do Hoover Institution na Universidade Stanford. Ao contrário de McCain, um bom homem e um verdadeiro herói americano, não pretendo votar nos republicanos em novembro. Votarei em Barack Obama.


A meritocracia está no cerne das crenças conservadoras americanas. Portanto, enfrentemos a situação: George W. Bush foi o pior presidente dos EUA de que se tem notícia. Sua administração foi inepta, corrupta e sem realizações. Depois do seu desempenho, por que daríamos aos republicanos mais uma oportunidade no comando?


Vamos dar ao outro partido uma oportunidade, ainda que suas políticas não sejam exatamente o que os conservadores possam gostar. Na América, chamamos isso de "demitir os vagabundos".


Quando a meritocracia é rebaixada, como tem sido durante os anos Bush, coisas desagradáveis acontecem. A pior de todas é que o racismo prosperou, porque a produtividade e as redes públicas se tornaram menos eficazes na proteção dos alvos de discriminação.


Em nenhum lugar isso é melhor ilustrado que na discussão atual, na América, em torno da imigração ilegal. Nem é tanto a ilegalidade da entrada de imigrantes nos EUA o que irrita muitos conservadores republicanos: são eles próprios, especialmente os hispânicos que não falam inglês. Não importa que os migrantes hispânicos estejam entre as pessoas que mais trabalham nos EUA.


É uma amarga ironia que John McCain, o herói de guerra, seja considerado um traidor pela ala conservadora do seu partido por ter uma atitude mais benevolente em relação a imigrantes sem documentos.


Lamentavelmente, o Partido Republicano foi seqüestrado durante os anos Bush por propagandistas que usavam frases em código como "imigração ilegal" e "protegendo a classe média" para dissimular o seu racismo, e "efeitos dos incentivos econômicos" para justificar políticas fiscais que pendem flagrantemente para o lado dos ricos.


Respondendo a essa política do ódio, Obama gosta de se chamar de "fomentador de esperança", não de "disseminador de ódio". É uma bela frase de efeito e cabe na medida.



Vamos dar ao outro partido uma oportunidade, ainda que suas políticas não sejam exatamente o que os conservadores possam gostar


A esperança sempre vende bem na América. Reagan entendeu isso e este é um dos principais motivos para ele ter sido um presidente notável e amado, ainda que algumas das suas políticas tenham sido falhas. Da mesma forma que Hillary Clinton - rival de Obama pela legenda democrata que está em acelerado enfraquecimento - está descobrindo, para seu espanto, que as políticas podem ser uma commodity superestimada em eleições presidenciais que realmente importam.


A esperança que Obama está oferecendo aos americanos é a da reconciliação - racial, política, entre ricos e pobres e entre a América e seus aliados. Isso é material poderoso e eclipsa os instintos tecnocráticos estreitos de Clinton, cuja abordagem escolar à campanha lhe rendeu merecida derrota após derrota nas primárias.


Assim como Reagan teve os "democratas de Reagan", que foram atraídos por sua mensagem de esperança após os anos de mal-estar de Jimmy Carter, Obama terá "republicanos de Obama" atraídos pela esperança de reconciliação e catarse nacionais.


Os não-americanos precisam entender que ainda existe uma outra revolução em gestação nos EUA, e que os senadores Clinton e McCain provavelmente serão varridos por ela. Quando republicanos conservadores apóiam democratas liberais (Obama foi avaliado o membro mais liberal do Senado dos EUA), "the times they are a-changin [os tempos estão mudando]", como escreveu Bob Dylan há 45 anos.


Além disso, uma diferença crucial, hoje, é que o conflito entre gerações que tanto caracterizou a década de 1960 - "Your sons and daughters are beyond your command [seus filhos e suas filhas estão além do seu controle]", como definiu Dylan - está ausente. Os jovens podem estar tomando a dianteira - o que Obama chama de "uma revolução de baixo para cima" - mas há pouca oposição dos seus pais.


De fato, eu conheço pessoalmente um bem-sucedido administrador de hedge fund nos EUA que é bem conservador e vota regularmente no Partido Republicano e que, no entanto, cogita apoiar Obama. Sua filha namora um afro-americano e, para seu mérito, ele crê em reconciliação racial. É verdade, uma vitória de Obama certamente aumentaria os seus próprios impostos, mas algumas coisas - por exemplo, a promessa de uma América multicultural - são simplesmente mais importantes.


Parece haver um grande número de republicanos e independentes que sentem o mesmo. Obama pode perder essas pessoas, mas se ele se esquecer de sua condição de reconciliador, não de guerreiro defensor de classes, e se partir da sua inclinação pelos pobres para uma posição de depenar os ricos.


Seja como for, os aliados da América deveriam se sentir aliviados pela forma como a eleição presidencial está se delineando. A América precisa de Obama e o ódio que os republicanos nutrem por ele é a sua insígnia de honra. Ele enfrentará os que têm ódio no país (inclusive do seu próprio partido) e os terroristas no exterior. Isso é preferível ao que temos hoje.


Melvyn Krauss é pesquisador sênior no Hoover Institution, na Universidade Stanford. © Project Syndicate/Europe´s World, 2008. www.project-syndicate.org



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