sexta-feira, 23 de novembro de 2007

A Lei nº 11.232 e os honorários advocatícios

A Lei nº 11.232 e os honorários advocatícios
André Guskow Cardoso
23/11/2007

A Lei nº 11.232, de 2005, produziu grandes inovações no Código de Processo Civil (CPC). Foram introduzidos os artigos 475-J a 475-R, que instituíram a fase de cumprimento de sentença regulando este procedimento. A principal novidade foi a supressão da necessidade de instauração de um processo executivo específico para se obter o cumprimento da sentença. A partir da vigência da Lei nº 11.232, tem-se apenas uma fase de cumprimento de sentença, e não mais um processo específico. De todo modo, como toda inovação no âmbito do processo civil, a introdução da fase de cumprimento de sentença trouxe alguma polêmica, especialmente no tocante à incidência de novos honorários, no caso da ausência de cumprimento espontâneo do julgado pelo vencido.

Aqueles que defendem o não cabimento da fixação de honorários fundamentam este entendimento na omissão da Lei nº 11.232, que nada menciona a respeito da incidência de honorários para a fase de cumprimento. Ademais, reputa-se que a ausência de um processo autônomo de execução da sentença impediria uma nova fixação de honorários - além daquela eventualmente realizada durante a fase de conhecimento. Para esta corrente, a previsão da multa de 10% para o caso de não cumprimento da sentença no prazo fixado pelo Código de Processo Civil - de 15 dias - afastaria a incidência de novos honorários. Indica-se que não poderia haver maior onerosidade ao devedor, que deveria suportar apenas aqueles encargos expressamente previstos em lei.


Há alguns tribunais que vêm aplicando esse entendimento, como o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) - no Agravo de Instrumento nº 0377371-9, relatado pelo desembargador Edvino Bochnia e julgado em 8 de março de 2007 - e o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) - no Agravo nº 70016982100, relatado pelo desembargador Paulo Sérgio Scarparo e julgado em 25 de setembro de 2006.


Para aqueles que defendem o cabimento dos honorários específicos para a fase de cumprimento de sentença, pouco importa que não exista processo autônomo. Se não houver o cumprimento espontâneo do julgado pelo vencido, devem incidir novos honorários. Para essa corrente, (1) há atuação específica do advogado na nova fase de cumprimento, o que exige a fixação de novos honorários em razão do princípio da causalidade; (2) o artigo 20, parágrafo 4º do Código de Processo Civil determina a incidência de honorários em toda a espécie de execução; (3) o vencido que não cumpre espontaneamente o julgado está obrigado a arcar com a multa de 10% e com os honorários advocatícios dessa fase específica; (4) é incompatível com o espírito da reforma processual substituir os honorários que antes eram fixados pela multa prevista no artigo 475-J do código processual.



A posição que defende o não cabimento de honorários não parece compatível com a finalidade da reforma


Também esta vertente é acolhida pelos tribunais, como o próprio TJRS, no Agravo nº 70019837152, julgado em 11 de julho de 2007 e que teve como relator o desembargador Bayard Ney de Freitas Barcellos; o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) no Agravo nº 1.088.844-0/5, relatado pelo desembargador Fernando Melo Bueno Filho e julgado em 19 de março de 2007; o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), no Agravo de Instrumento nº 1.0145.02.016771-7/001, relatado pelo desembargador Renato Martins Jacob e julgado em 31 de maio deste ano; e Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) no Agravo de Instrumento nº 3231, relatado pelo desembargador Roberto Wider e julgado em 10 de abril também deste ano.


A posição adotada por aqueles que defendem o não cabimento de honorários para a fase de cumprimento de sentença não parece adequada ou mesmo compatível com a finalidade buscada com a reforma do processo executivo. Afinal, as mudanças introduzidas no Código de Processo Civil pela Lei nº 11.232 se prestam justamente a obter do vencido o cumprimento mais célere da sentença transitada em julgado. Por isso mesmo, previu-se no artigo 475-J do código a incidência imediata da multa de 10% no caso de não cumprimento do julgado no prazo de 15 dias. Ora, não tem cabimento substituir os honorários que eram fixados para pronto pagamento no regime anterior à Lei nº 11.232 pela multa agora prevista pelo artigo 475-J do código. Se a finalidade da reforma é compelir o vencido a cumprir efetivamente o julgado em determinado prazo, não há qualquer razão em se reduzir o ônus que recai sobre aqueles que não cumprem espontaneamente uma decisão transitada em julgado. Por isto, é perfeitamente compatível com o espírito da reforma do código a fixação dos honorários advocatícios, sem prejuízo da multa estipulada pelo artigo 475-J da lei processual.


O argumento segundo o qual não haveria processo autônomo, mas mera fase de processo anterior, de conhecimento, também não se sustenta. Incide o princípio da causalidade, consagrado pelo artigo 20 do Código de Processo Civil. Neste sentido, a jurisprudência vem reconhecendo que "iniciada a fase de cumprimento de sentença na vigência da Lei nº 11.232 e transcorrido 'in albis' o prazo de 15 dias para pagamento da condenação, devem ser fixados os honorários advocatícios na fase de execução forçada, por força do princípio da causalidade, aplicando-se o disposto no parágrafo 4º do artigo 20 do Código de Processo Civil", conforme estabelece a decisão do TJSP no Agravo de Instrumento nº 1096015-0/6, relatado pelo desembargador William Campos e julgado em 6 de fevereiro de 2007, e, no mesmo sentido, o Agrado de Instrumento nº 1068801-0/1, relatado pelo desembargador Egidio Giacoia e julgado em 23 de outubro de 2006.


Além disso, efetivamente o parágrafo 4º do artigo 20 do Código de Processo Civil não faz qualquer distinção a respeito do cabimento dos honorários advocatícios. Nos termos do referido dispositivo, são cabíveis honorários nas execuções embargadas (impugnadas) ou não. Deste modo, é plenamente cabível a fixação de honorários específicos para a fase de execução de sentença. Somente não são devidos honorários no caso de cumprimento espontâneo da sentença pelo vencido, dentro do prazo de 15 dias do trânsito em julgado da decisão. Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já reconheceu que constitui ônus do devedor acompanhar a ocorrência do trânsito em julgado e adotar as providências necessárias ao cumprimento do julgado, se não quiser arcar com a multa prevista no artigo 475-J do código, conforme o Recurso Especial nº 954.859, do Rio Grande do Sul.


Em todas as demais hipóteses, havendo necessidade de manifestação do credor (através de advogado) para obter o cumprimento da sentença, é cabível a fixação de novos honorários.


André Guskow Cardoso é advogado associado do escritório Justen, Pereira, Oliveira & Talamini Advogados Associados


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