terça-feira, 20 de novembro de 2007

O Poder Judiciário e o tributo da Justiça

O Poder Judiciário e o tributo da Justiça
João Luiz Coelho da Rocha
20/11/2007

Os impostos que pagamos - e que não são poucos nem de baixa incidência, como se sabe - se destinam a custear as despesas (muitas e sempre crescentes) e os investimentos gerais (sempre menores que os necessários, como é patente) do Estado. Eles não têm uma destinação muito específica e identificada: custeiam os salários do funcionalismo público em geral, viagens, despesas de expediente, tanto quanto equipamentos, obras públicas etc. Para serviços públicos utilizados ou postos à disposição dos contribuintes, serviços específicos e divisíveis, assim como pelo poder de polícia geral, nos são cobradas taxas - tributo todo próprio com uma afetação direta e determinada de sua arrecadação.

Descartando aqui qualquer diferenciação mais precisa entre taxas e tarifas, pagamos tais tributos de custeio por conta dos serviços de combate a incêndio, de coleta de lixo, de acesso generalizado, e, entre outros, e por serviços mais tecnicamente restritos: de fiscalização do mercado de capitais - como a taxa de fiscalização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) - e de acesso ao Poder Judiciário - a taxa judiciária. Como são tributos afetados diretamente a certos serviços prestados ou colocados à disposição do contribuinte, a base de cálculo das taxas há de ser necessariamente ligada ao custo de tal serviço, ou seja, o quanto o poder público está dispendendo para tal prestação "divisível e específica" de serviço.

Por essas razões, mostra-se absurda e injurídica a fixação de taxas baseadas em parâmetros quantitativos que nada têm a ver com a intensidade ou custo do serviço em tela. A CVM fixa sua taxa de fiscalização em razão do valor do patrimônio líquido da sociedade ali registrada, sendo pouco crível que o maior ou menor volume desta rubrica do passivo da empresa signifique um maior esforço de fiscalização por parte da autarquia.


No caso do Poder Judiciário o fenômeno é ainda mais grave e a distorção mais gritante. Qualquer um - salvo casos comprovados de insuficiência econômica crônica - tem que pagar 2% do valor de sua pretensão levada a juízo, a título de taxa judiciária. Assim, se uma pessoa sofreu um calote sério na venda de um imóvel, e é credora de um valor substancial de R$ 1 milhão, por exemplo, não vai conseguir sequer chegar ao Judiciário sem antes pagar R$ 20 mil de taxa. Isto é, já depauperada, ainda vai ter que arcar com tal custo pesado antes de iniciar sua conhecida via crucis de cobrança. E, no entanto, está na cara que o valor econômico maior ou menor de uma questão levada a juízo em nada influencia o trabalho do Judiciário, tornando-o mais ou menos gravoso. Uma mera querela de pouca importância econômica pode, de seu lado, envolver uma matéria probatória mais extensa, com perícias e avaliações, necessitando de um maior envolvimento da máquina judiciária - enquanto aquela sugerida cobrança de R$ 1 milhão pode, se contida em uma promissória adequada, requerer muito menos ação do poder jurisdicional.



No Judiciário, pelos altos valores exigíveis, há um desestímulo a muitos ofendidos em seus direitos


Estes abusos de quantificação perduram há anos entre nós, pervertendo o conceito de taxa como tributo de custeio direto de serviços públicos. No caso do Judiciário, pelos altos valores que acabam se mostrando exigíveis, há um fator de desestímulo a muitos ofendidos em seus direitos, e criou-se ainda uma disseminação de incidentes processuais dedicados à discussão do valor deste tributo caso a caso.


Um dos anseios legítimos do tão sonhado código de proteção do contribuinte seria a criação de meios de defesa contra tais abusos do poder público que, por tal facilidade de cobrança, castiga os que têm direitos afetados e premia os devedores. O argumento, usado em decisões superiores, para este uso distorcido do valor da causa como base para a taxa judiciária, é o de que não se teria modo de calcular o custo próprio a cada processo. Contudo, a solução justa para esta dificuldade inicial não pode vir desse meio distorcido e evidentemente ilógico de se fixar o tributo. Muito melhor, e decerto possível, seria a estimativa estatística do custo anual do Judiciário, Estado por Estado, pois a taxa é estadual - e a previsão probabílistica o mais acurada possível de seu incremento no ano seguinte, com uma concessão protetora de um quantum a mais, valor (dividendo) a ser assim rateado pelo número igualmente calculado com base nos anos precedentes do numero de processos a serem ajuizados (divisor). Assim se chegaria a um valor uniforme e universal, para aquele exercício, da taxa judiciária, mais conforme ao conceito e à estrutura deste tributo contido em nossa ordem jurídica e acabando-se com os absurdos presentes na prática judiciária deste país.


Nossa tradicional resistência corporativa e política a tais soluções mais práticas e justas e nosso apego às simplificações injustas sempre reagem a tais propostas. No entanto, é dever do cidadão insistir e não se calar diante deste monstrengo atual que é o cálculo da taxa judiciária, mais um motivo criado para se desacreditar no socorro do Poder Judiciário.


João Luiz Coelho da Rocha é advogado, sócio do escritório Bastos-Tigre, Coelho da Rocha e Lopes Advogados e professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro


Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações


2 comentários:

Anônimo disse...

Os impostos estão diretamente ligados a história humana na terra.O primeiro registro entre os Sumèrios em escrita cuneiforme.Os cobradores exploravam a classe menos favorecida.E o rei que era insuflado pelo sumo sacerdote cometias as suas vilanias.Notamos a primeira Revolução da história da Humanidade o povo Freedom(Liberdade).
Na guerra da Independência Americana contra a coroa Inglesa.Thomas Jefferson escreveu a famosa Constituição Americana.Em cujo texto está implícito que todos os homens possuem o mesmo criador e têm direito a liberdade.Os próprios articuladores foram buscar na França que passava por um processo de reformulações.Luiz XIX desconhecia a miséria do povo e o ignorava.
A burguesia foi uma das principais articuladoras deste processo.Onde os camponeses e artesãos entraram na Revolta.
Faço digno de afirmar que para um Revolução é preciso de homens unidos em torno de um único ideal.
Pois senão teremos uma gerra civil.
No Brasil analisando in loco.Os politícos estão no Poder que fascina por demais o homem.
Os desmandos são vìsiveis.A corrupção está em todos os escalões.E o povo vai levando como um par burros leva sua canga.

Ricardo

Anônimo disse...

Parece que a defensoria pública não funciona ou age de má vontade oom as pessoas carentes.Em uma livraria,não sou de escutar conversa alheia.Mas conversei com a Senhora que disse que o advogado não mexia uma palha no processo.E o outro advogado diplomaticamente a orientou a insistir.
Pimenta nos olhos dos outros é refresco.
Pelo dinheiro,todos querem levar algum.Então a Justiça e sua morosidade chega a ser letárgica.
O Capital tudo nesta sociedade gira em torno dele.Karl Marx já antevia a globalização.
Quem senão Cristo para olhar para estes excluidos.
E saí decepcionado caminhando lentamene descrente da solidariedade do juramento que todos prestam na formatura.
Lembrei de Pablo Neruda poeta e contêmporaneo de Jorge luis Borges um dos maiores escritores do seculo XX.
Em Barcarola:Oh Novos guerreiros!que surja um Deus maior que o dinheiro.
A Compaixão,misericórdia para seu irmão,a fratenidade,compartilhar não apenas matéria.Mas laços que prendam e envolvam.
"Éramos eternmente sós no deserto tìnhamos a luz das estrelas sob nós mas bastava sentar-nos em torno da fogueira e trocávmos riquezas ínvisiveis".
(Exupéy)

Ricardo