sexta-feira, 2 de novembro de 2007

O ilusionismo de Mantega

O ilusionismo de Mantega GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA FSP

Ao declarar que 80% ou 90% dos brasileiros não pagarão a CPMF, o ministro Guido Mantega (Fazenda) pratica um ilusionismo numérico que, se levado a sério, faria desaparecer a principal distorção do sistema tributário brasileiro -carga excessiva e baseada em tributos indiretos, embutidos nos preços de bens e serviços.
Afinal, o ministro poderia ir até mais longe. Nenhum brasileiro, por exemplo, paga PIS, Cofins, CSLL, IPI, ICMS, ISS, FGTS, contribuições para o sistema S e outros vilões sempre apontados nas propostas de reforma. Mesmo entre as empresas, mais de 95% não arcam com a maior parte desses tributos, por serem de micro e pequeno porte.
Outros 87% das pessoas físicas empregadas passam longe do Imposto de Renda, por falta de renda, enquanto metade ou mais da força de trabalho está na informalidade e não contribui para a Previdência. Logo, pela mágica matemática de Mantega, apenas uma meia dúzia de abastados e grandes empresas produzem os sucessivos recordes de arrecadação comemorados pela Receita Federal.
O truque, porém, nem chega a ser dos mais sofisticados: a carga de impostos, contribuições e taxas cobradas por União, Estados e municípios é distribuída por toda a sociedade, independentemente de quais sejam as pessoas físicas e jurídicas encarregadas da formalidade de fazer o pagamento ao fisco. A curiosidade que resta é ver um petista contrariar as teses históricas do partido e oferecer argumentos em favor dos tributos considerados mais injustos socialmente.
CPMF, Cofins e ICMS, para citar os mais importantes, são custos fixos para as empresas e, como qualquer custo, estão incorporados nos preços das mercadorias produzidas ou dos serviços oferecidos. A relação é tão óbvia que, em países como os EUA, as lojas discriminam qual é o peso dos tributos nos preços cobrados.
Como a CPMF embutida no preço do feijão ou do telefone celular é a mesma para os pobres e para os ricos, os primeiros gastam uma parcela de sua renda maior que a dos segundos no pagamento da contribuição provisória. É o oposto do que ocorre no IR, cuja alíquota aumenta conforme a renda do contribuinte.
Ao menos aos olhos do fisco, os tributos indiretos têm vantagens importantes. São mais fáceis de cobrar, atingem todas as faixas de renda e a economia informal -também ao contrário do que ocorre no IR.
Não por acaso, apenas 21% da arrecadação brasileira provém da renda, contra 48% do consumo, segundo estudo da Receita de 2004. Nos EUA, a renda responde por 49% da receita, e o consumo, por 16%. É graças aos tributos indiretos que o Brasil, com renda muito menor, tem carga tributária tão grande ou maior que a americana.

Nenhum comentário: